segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Tu cá tu lá II




- Como está o senhor?
- Não muito bem, obrigado.
- Então?
- Ando com uma dor…
- Menos mal!
- Como?
- Compreendo a estranheza da questão.
- Considera a dor um mal menor?
- Sim. A dor, para o artista, também é uma inspiração!




rla

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

percurso poético IV




A história começa de uma maneira pouco usual...

Ninguém sabia o nome do homem que ali estava, discursando no meio da praça e seguido atentamente por dezenas de pessoas.

Não era padre nem pregador.
Não era politico, não era candidato e muito menos presidente de Junta.
Não era dirigente associativo nem de nenhum clube desportivo.

Mas certamente que tinha o dom da palavra.
Com o evoluir do discurso mais gente se acumulava em seu redor. E os que o ouviam, ficavam, sem pressa e sem compromissos de maior importância. Notava-se nos seus rostos um prazer único por cada palavra recebida.

Investiguei o caso com relativa curiosidade.
Questionei algumas pessoas da multidão, que de tão atentas nem deram conta da minha presença.
Entrei no café central, onde as noticias surgiam em primeira mão pela boca dos clientes, mas quase todos tinham já acorrido à praça e o dono, pobre capitão do navio proibido de o abandonar, lastimava-se inconsolável por também permanecer na ignorância.
Indaguei um taxista que aguardava cliente dentro do carro. Contudo, após estrebuchar do seu sono, limitou-se a observar ao longe o ajuntamento inesperado no largo da praça, revelando maior surpresa que a minha.

Até que, numa corrida fugaz, serpenteando os homens e as mulheres estacados em pé, passaram  a meu lado duas crianças esbaforidas. Agarrei o braço de uma delas e perguntei:

- Ouve lá rapaz, sabes quem é aquele senhor ali no meio?

Ao que ele me responde, ainda meio assustado:

- Dizem que é um poeta!





rla

domingo, 6 de dezembro de 2015

percurso poético III




Um remoinho de folhas dança aos meus pés à medida que avanço pela rua. Está uma manhã luminosa e amena, distante das memórias dos dias de novembro que me obrigavam a embrulhar em casacos e lenços de algodão.

O ar perfumado pelo despertar ainda ténue da natureza.

Alguém, algures num prédio de doze andares, espera por mim para uma reunião de trabalho. O meu corpo rejeita o habitual percurso e leva-me instantaneamente pela terra batida de um jardim. Um caminhar desprendido e prazeroso sob os raios de sol que perfuram as copas das árvores.

Quando entrar no gabinete, de sorriso aberto na cara, com certeza que ninguém irá acreditar na desculpa irreal do trânsito...






rla

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

percurso poético II






acordar é um martírio.

ou porque temos que abandonar o prazer de um sono morno e relaxante

ou porque acabámos de desperdiçar um tempo de vida útil em vivências irreais

acordar não é bom,
já que não podemos continuar a dormir.

acordar é frustrante,
pois percebemos que desperdiçámos horas autónomas e conscientes.

acordar é sempre um martírio.



antes viver sempre no sonho...




rla